18 de junho de 2025

O MEU CARRO

Quando digo "o meu carro" falo do carro que é meu neste momento. Outros houve, e em princípio outros haverá, se bem que seja avessa a trocar de carro como quem troca de camisa. Por mim, não me importava de ficar com este para sempre. Na verdade, já o tenho há 16 longos anos -- é quase um clássico! -- e nunca me defraudou ou, como se costuma dizer, "nunca me deixou ficar mal": nada de avarias no meio de nenhures, nada de sobreaquecimento, ou ruídos esquisitos, ou fugas de óleo, ou problemas elétricos. Nem sequer um furo! (Lagarto-lagarto!) E sempre obediente, a acelerar como um menino impaciente sempre que carrego no prego, aguentando centenas de quilómetros, suave e constante. Comprei-o novinho em folha, com aquele cheirinho a boneca nova, e tive o prazer de escolher os acabamentos: estofos de pele bege e pintura em azul noite. Desculpem, parecem pormenores frívolos, mas para mim um carro é um objeto importante nas nossas vidas, que usamos diariamente e que nos permite essa coisa que se chama... LIBERDADE! Há lá luxo maior do que sairmos estrada fora quando nos apetece e para onde nos apetece? Ah, que maravilha! Por isso tirei a carta mal fiz 18 anos, e nessa altura servi-me bem de uma pandeireta que os meus pais me compraram em segunda mão, um R5 sem AC nem direção assistida. Mas voltemos ao presente, e ao desenho que fiz do meu já entradote 120d:

A este quadro de bovina satisfação automobilística, devo agora acrescentar a minha mágoa. Não estou a referir-me às conotações de novo-riquismo que há muito se colaram à marca, para minha pena. Trata-se de um outro desgosto que desenvolvi recentemente, depois de por acaso esbarrar num livro sobre o Holocausto. Bem, eu sabia que a BMW, sendo alemã (Bavarian Motor Works), se projetava historicamente na época e na geografia do espetro nazi. Mas não tinha conhecimento de que, em Auschwitz, muitos dos prisioneiros eram obrigados a trabalhar -- malnutridos, desidratados e doentes -- nas fábricas da BMW, uma espécie de antecâmara da morte. Céus! E eu a fazer-me transportar num herdeiro desse legado. Repugna-me. Mas tento pensar que as coisas mudaram e que a desnazificação germânica surtiu, entretanto, frutos genuínos.